"Comunicar
a família: “Comunicar a família: ambiente privilegiado do encontro na
gratuidade do amor” é o tema da mensagem para o 49º Dia Mundial das
Comunicações Sociais. O evento será celebrado no dia 17 de maio, domingo
que antecede Pentecostes. A íntegra do texto foi divulgada hoje, 23,
durante coletiva de imprensa, no Vaticano.
Para
a vivência e celebração do Dia Mundial das Comunicações Sociais, a
Comissão Episcopal para a Comunicação da Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil (CNBB), prepara, todos os anos, um subsídio com orientações e
sugestões de atividades para os regionais, dioceses, paróquias e
comunidades.
O
material é enviado as coordenações e lideranças da Pastoral da
Comunicação (Pascom), responsáveis por articular e animar a comunicação
nas igrejas locais. A Comissão orienta, também, o estudo do Diretório de Comunicação da Igreja no Brasil, que traz pistas de ação. Contato pelo e-mail: comsocial@cnbb.org.br
Família mais bela
A coletiva de
apresentação da mensagem contou com a presença do presidente do
Pontifício Conselho para as Comunicações Sociais, dom Claudio Maria
Celli, a professora da Faculdade de Letras e Filosofia - Departamento de
Ciências das Comunicações da Universidade Católica do Sagrado Coração
de Milão (Itália), Chiara Giaccardi, e o professor da Faculdade de
Ciências Políticas, Mario Magatti.
A
reflexão proposta pelo papa Francisco está inserida no caminho sinodal
da Assembleia Ordinária do Sínodo sobre a Família que acontecerá em
outubro próximo. “A família mais bela, protagonista e não problema, é
aquela que, partindo do testemunho, sabe comunicar a beleza e a riqueza
do relacionamento entre o homem e a mulher, entre pais e filhos”,
escreveu o papa na mensagem.
Confira íntegra do texto:
Mensagem de Sua Santidade o Papa Francisco
49º Dia Mundial das Comunicações Sociais
17 de Maio de 2015
Tema: “Comunicar a família: ambiente privilegiado do encontro na gratuidade do amor”
O tema da
família encontra-se no centro duma profunda reflexão eclesial e dum
processo sinodal que prevê dois Sínodos, um extraordinário – acabado de
celebrar – e outro ordinário, convocado para o próximo mês de Outubro.
Neste contexto, considerei oportuno que o tema do próximo Dia Mundial
das Comunicações Sociais tivesse como ponto de referência a família.
Aliás, a família é o primeiro lugar onde aprendemos a comunicar. Voltar a
este momento originário pode-nos ajudar quer a tornar mais autêntica e
humana a comunicação, quer a ver a família dum novo ponto de vista.
Podemos
deixar-nos inspirar pelo ícone evangélico da visita de Maria a Isabel
(Lc 1, 39-56). “Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, o menino
saltou-lhe de alegria no seio e Isabel ficou cheia do Espírito Santo.
Então, erguendo a voz, exclamou: “Bendita és tu entre as mulheres e
bendito é o fruto do teu ventre” (vv. 41-42).
Este
episódio mostra-nos, antes de mais nada, a comunicação como um diálogo
que tece com a linguagem do corpo. Com efeito, a primeira resposta à
saudação de Maria é dada pelo menino, que salta de alegria no ventre de
Isabel. Exultar pela alegria do encontro é, em certo sentido, o
arquétipo e o símbolo de qualquer outra comunicação, que aprendemos
ainda antes de chegar ao mundo. O ventre que nos abriga é a primeira
“escola” de comunicação, feita de escuta e contato corporal, onde
começamos a familiarizar-nos com o mundo exterior num ambiente protegido
e ao som tranquilizador do pulsar do coração da mãe. Este encontro
entre dois seres simultaneamente tão íntimos e ainda tão alheios um ao
outro, um encontro cheio de promessas, é a nossa primeira experiência de
comunicação. E é uma experiência que nos irmana a todos, pois cada um
de nós nasceu de uma mãe.
Mesmo
depois de termos chegado ao mundo, em certo sentido permanecemos num
“ventre”, que é a família. Um ventre feito de pessoas diferentes,
interrelacionando-se: a família é “o espaço onde se aprende a conviver
na diferença” (Exort. ap. Evangelii gaudium, 66). Diferenças de géneros e
de gerações, que comunicam, antes de mais nada, acolhendo-se
mutuamente, porque existe um vínculo entre elas. E quanto mais amplo for
o leque destas relações, tanto mais diversas são as idades e mais rico é
o nosso ambiente de vida. O vínculo está na base da palavra, e esta,
por sua vez, revigora o vínculo. Nós não inventamos as palavras: podemos
usá-las, porque as recebemos. É em família que se aprende a falar na
“língua materna”, ou seja, a língua dos nossos antepassados (cf. 2 Mac
7, 21.27). Em família, apercebemo-nos de que outros nos precederam, nos
colocaram em condições de poder existir e, por nossa vez, gerar vida e
fazer algo de bom e belo. Podemos dar, porque recebemos; e este circuito
virtuoso está no coração da capacidade da família de ser comunicada e
de comunicar; e, mais em geral, é o paradigma de toda a comunicação.
A experiência
do vínculo que nos “precede” faz com que a família seja também o
contexto onde se transmite aquela forma fundamental de comunicação que é
a oração. Muitas vezes, ao adormecerem os filhos recém-nascidos, a mãe e
o pai entregam-nos a Deus, para que vele por eles; e, quando se tornam
um pouco maiores, põem-se a recitar juntamente com eles orações simples,
recordando carinhosamente outras pessoas: os avós, outros parentes, os
doentes e atribulados, todos aqueles que mais precisam da ajuda de Deus.
Assim a maioria de nós aprendeu, em família, a dimensão religiosa da
comunicação, que, no cristianismo, é toda impregnada de amor, o amor de
Deus que se dá a nós e que nós oferecemos aos outros.
Na família, é
sobretudo a capacidade de se abraçar, apoiar, acompanhar, decifrar
olhares e silêncios, rir e chorar juntos, entre pessoas que não se
escolheram e todavia são tão importantes uma para a outra… é sobretudo
esta capacidade que nos faz compreender o que é verdadeiramente a
comunicação enquanto descoberta e construção de proximidade. Reduzir as
distâncias, saindo mutuamente ao encontro e acolhendo-se, é motivo de
gratidão e alegria: da saudação de Maria e do saltar de alegria do
menino deriva a bênção de Isabel, seguindo-se-lhe o belíssimo cântico do
Magnificat, no qual Maria louva o amoroso desígnio que Deus tem sobre
Ela e o seu povo. De um “sim” pronunciado com fé, derivam consequências
que se estendem muito para além de nós mesmos e se expandem no mundo.
“Visitar” supõe abrir as portas, não encerrar-se no próprio apartamento,
sair, ir ter com o outro. A própria família é viva, se respira
abrindo-se para além de si mesma; e as famílias que assim procedem,
podem comunicar a sua mensagem de vida e comunhão, podem dar conforto e
esperança às famílias mais feridas, e fazer crescer a própria Igreja,
que é uma família de famílias.
Mais do que em
qualquer outro lugar, é na família que, vivendo juntos no dia-a-dia, se
experimentam as limitações próprias e alheias, os pequenos e grandes
problemas da coexistência e do pôr-se de acordo. Não existe a família
perfeita, mas não é preciso ter medo da imperfeição, da fragilidade, nem
mesmo dos conflitos; preciso é aprender a enfrentá-los de forma
construtiva. Por isso, a família onde as pessoas, apesar das próprias
limitações e pecados, se amam, torna-se uma escola de perdão. O perdão é
uma dinâmica de comunicação: uma comunicação que definha e se quebra,
mas, por meio do arrependimento expresso e acolhido, é possível reatá-la
e fazê-la crescer. Uma criança que aprende, em família, a ouvir os
outros, a falar de modo respeitoso, expressando o seu ponto de vista sem
negar o dos outros, será um construtor de diálogo e reconciliação na
sociedade.
Muito têm para
nos ensinar, a propósito de limitações e comunicação, as famílias com
filhos marcados por uma ou mais deficiências. A deficiência motora,
sensorial ou intelectual sempre constitui uma tentação a fechar-se; mas
pode tornar-se, graças ao amor dos pais, dos irmãos e doutras pessoas
amigas, um estímulo para se abrir, compartilhar, comunicar de modo
inclusivo; e pode ajudar a escola, a paróquia, as associações a
tornarem-se mais acolhedoras para com todos, a não excluírem ninguém.
Além disso, num
mundo onde frequentemente se amaldiçoa, insulta, semeia discórdia,
polui com as murmurações o nosso ambiente humano, a família pode ser uma
escola de comunicação feita de bênção. E isto, mesmo nos lugares onde
parecem prevalecer como inevitáveis o ódio e a violência, quando as
famílias estão separadas entre si por muros de pedras ou pelos muros
mais impenetráveis do preconceito e do ressentimento, quando parece
haver boas razões para dizer “agora basta”; na realidade, abençoar em
vez de amaldiçoar, visitar em vez de repelir, acolher em vez de combater
é a única forma de quebrar a espiral do mal, para testemunhar que o bem
é sempre possível, para educar os filhos na fraternidade.
Os meios mais
modernos de hoje, irrenunciáveis sobretudo para os mais jovens, tanto
podem dificultar como ajudar a comunicação em família e entre as
famílias. Podem-na dificultar, se se tornam uma forma de se subtrair à
escuta, de se isolar apesar da presença física, de saturar todo o
momento de silêncio e de espera, ignorando que “o silêncio é parte
integrante da comunicação e, sem ele, não há palavras ricas de conteúdo”
(BENTO XVI, Mensagem do 49º Dia Mundial das Comunicações Sociais,
24/1/2012); e podem-na favorecer, se ajudam a narrar e compartilhar, a
permanecer em contato com os de longe, a agradecer e pedir perdão, a
tornar possível sem cessar o encontro. Descobrindo diariamente este
centro vital que é o encontro, este “início vivo”, saberemos orientar o
nosso relacionamento com as tecnologias, em vez de nos deixarmos
arrastar por elas. Também neste campo, os primeiros educadores são os
pais. Mas não devem ser deixados sozinhos; a comunidade cristã é chamada
a colocar-se ao seu lado, para que saibam ensinar os filhos a viver, no
ambiente da comunicação, segundo os critérios da dignidade da pessoa
humana e do bem comum.
Assim o desafio
que hoje se nos apresenta, é aprender de novo a narrar, não nos
limitando a produzir e consumir informação, embora esta seja a direção
para a qual nos impelem os potentes e preciosos meios da comunicação
contemporânea. A informação é importante, mas não é suficiente, porque
muitas vezes simplifica, contrapõe as diferenças e as visões diversas,
solicitando a tomar partido por uma ou pela outra, em vez de fornecer um
olhar de conjunto.
No fim de
contas, a própria família não é um objeto acerca do qual se comunicam
opiniões nem um terreno onde se combatem batalhas ideológicas, mas um
ambiente onde se aprende a comunicar na proximidade e um sujeito que
comunica, uma “comunidade comunicadora”. Uma comunidade que sabe
acompanhar, festejar e frutificar. Neste sentido, é possível recuperar
um olhar capaz de reconhecer que a família continua a ser um grande
recurso, e não apenas um problema ou uma instituição em crise. Às vezes
os meios de comunicação social tendem a apresentar a família como se
fosse um modelo abstrato que se há de aceitar ou rejeitar, defender ou
atacar, em vez duma realidade concreta que se há de viver; ou como se
fosse uma ideologia de alguém contra outro, em vez de ser o lugar onde
todos aprendemos o que significa comunicar no amor recebido e dado. Ao
contrário, narrar significa compreender que as nossas vidas estão
entrelaçadas numa trama unitária, que as vozes são múltiplas e cada uma é
insubstituível.
A família mais
bela, protagonista e não problema, é aquela que, partindo do testemunho,
sabe comunicar a beleza e a riqueza do relacionamento entre o homem e a
mulher, entre pais e filhos. Não lutemos para defender o passado, mas
trabalhemos com paciência e confiança, em todos os ambientes onde
diariamente nos encontramos, para construir o futuro.
Vaticano, 23 de Janeiro – Vigília da Festa de São Francisco de Sales – de 2015.
Papa Francisco
Fonte: CNBB
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